A prática da advocacia predatória, embora não seja uma novidade, tem ganhado destaque e preocupação no cenário jurídico brasileiro. Esse tipo de atuação se caracteriza pelo ajuizamento de um número massivo de ações judiciais, muitas vezes com petições iniciais idênticas, movidas contra grandes empresas em diversas jurisdições. Tais ações, frequentemente, trazem causas de pedir genéricas, pouco fundamentadas ou até mesmo infundadas, sem o devido suporte documental ou mesmo o conhecimento do autor da demanda.
Essa estratégia tem como objetivo sobrecarregar o sistema judiciário e dificultar a defesa das empresas demandadas, que enfrentam o desafio de contestar um grande volume de processos em prazos curtos, limitando a sua capacidade de produzir uma defesa sólida e eficaz. Esse movimento, além de impactar negativamente a imagem das empresas, tem gerado um aumento significativo de despesas processuais e prejuízos para o Poder Judiciário.
Conforme dados apresentados pelo Núcleo de Monitoramento dos Perfis de Demandas da Corregedoria Geral do Tribunal de Justiça de São Paulo (Numopede), em 2023, foram registrados cerca de 330 mil processos de natureza predatória, gerando um impacto financeiro de aproximadamente R$ 2,7 bilhões ao maior tribunal do país. Esse cenário evidencia não apenas o aumento das demandas, mas também a sobrecarga que tais práticas impõem ao sistema judiciário, já sobrecarregado por litígios comuns.
Contudo, há uma certa resistência em enfrentar essa questão diretamente no curso dos processos. Advogados relutam em acusar seus pares por medo de represálias, enquanto magistrados hesitam em tomar providências por temerem prejudicar o direito de ação da parte autora, um direito constitucional assegurado.
Apesar das dificuldades mencionadas, é fundamental que, quando houver fortes indícios de advocacia predatória, os advogados das partes adversas assumam a responsabilidade de apontar essas práticas e demandem ações corretivas. O primeiro passo é evidenciar os indícios de irregularidade de forma clara e objetiva, permitindo que o magistrado avalie as circunstâncias e adote as providências cabíveis.
Em casos mais graves, os magistrados podem exigir que o advogado do demandante comprove que seu cliente está ciente da demanda, seja por meio da apresentação de uma procuração com firma reconhecida, pela participação do autor em audiências, ou até pela expedição de mandado de constatação.
Uma possível solução mais formal está na aprovação do Tema 1.198 pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), que possibilitaria que juízes exijam, de ofício, que as petições iniciais sejam emendadas com a apresentação de documentos que fundamentem minimamente as pretensões deduzidas em juízo.
Embora o combate à advocacia predatória seja um tema delicado e ainda pouco explorado em certos âmbitos judiciais, é crucial que tanto advogados quanto magistrados se envolvam de maneira mais ativa na identificação e combate a essas práticas. O enfrentamento desse problema não só beneficia o sistema jurídico ao reduzir a sobrecarga de processos, como também preserva a integridade das relações entre empresas e consumidores.
Dessa forma, com uma postura proativa por parte dos tribunais e um maior debate dentro do âmbito jurídico, espera-se que a advocacia predatória se torne uma prática cada vez mais rara, promovendo um ambiente de maior justiça e equidade nos tribunais.
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